Tuesday, January 12, 2016

Tudo acaba onde começou




Sete. Número místico. Fala-se em setênios ou virada de fase a cada sete anos. Pois bem, depois de um ciclo inteiro da minha vida, estou de volta. Deixei o blog quando ingressei numa das mais difíceis empreitadas que encontrei: um mestrado em artes liberais na conceituadíssima Johns Hopkins University. Paguei caro para completar o curso em metade do tempo e ter como colegas os professores da instituição. Por vezes varava noites na biblioteca e saia de lá com a clara noção de que apesar dos meus esforços, era provavalemente a aluna menos aplicada daquele meio - certeza que aqueles japoneses nunca se adaptaram ao fuso horário.. Por outro lado, senti pela primeira vez o orgulho que é conquistar uma bolsa de estudos e enfrentar o monstro, que ao final de dois anos e meio, me renderia um convite para apresentação do colloquium da universidade ao lado de feras da física, literatura, música e etc. Um baita feito pra brasileira que iniciou o curso arranhando um inglês encabulado...

Cidadã Americana

Quando comecei a escrever esse blog, achei que poderia ser um relato de curiosidades da vida no estrangeiro. Misturei um pouco de tudo que observava nas redondezas: uma pitada de política, economia, cultura, cinema e meu caminhar professional. O resumo da minha experiência me parecia um intercâmbio salutar com os leitores. Só que vivo à base de inspirações e a minha paixão andou passeando por outros corredores. Deixei um pouco minha mente que “pensa” pra me aventurar no mundo do improviso, do impulso, da falta de julgamento, do bateu-levou, da ação-reacão, do zero controle. Fui parar em Los Angeles, num longo processo de sensibilização. Passei a ser treinada para o “sentir”, que pouco tinha a ver com o histórico acadêmico. E optei por uma profissão que exige profissionais inteligentes mas que não pensam com o cérebro, e sim com o sangue e todas as células do corpo. Uma profissão exigente. Sem meio comprometimento. Um esporte de aventura, radical, de grande adrenalina. Basicamente me tornei atriz em tempo integral.

Gravação do Mad Men

Enfermeira da Enterprise - set Star Trek
Bah! Foi a segunda vez que o mundo se abriu pra mim. Difícil, desafiador, mas de um raro prazer. Me dei conta de realizar um sonho sem ao menos ter sonhado! A culpa era do Rafa. Muito mais visionário do que eu, soube que uma mudança pra LA me sairia bem mais proveitosa do que a ida permanente para NY. Resisti no começo. Mas bastaram dois dias pra que eu me sentisse em casa na nova cidade. Ao passo que meus julgamentos acerca de “Hollywood”  caíam por terra, eu também me desconstruía. Não foi fácil migrar do acadêmico para o prático. A vontade de fazer a cena perfeita me perseguia até entender que na arte a perfeição está no erro. Abraçar a imperfeição. Demonstrar minhas fraquezas. Achar a essência no meio de tanto burburinho. Um tanto assustador convencer aquela indústria já tão estruturada de que eu era a próxima revelacão do cinema! Ahhh como a gente aprende. Rs. Investi tudo que tinha pra dar e colhi o resultado. Me formei na técnica Meisner, consegui uma equipe de representantes altamente apaixonados, virei SAG actor, trabalhei em grandes sets, cresci no IMDB, fiz campanhas publicitárias de peso e atuei à beça. Quantos projetos, quantos testes..

Backstage | Épico comercial da Budweiser (SuperBowl)
verdade é que quando parti, fui pra não voltar. Era daquelas que dizem, “Demorei muito pra sair, mas agora vou de vez”. Só que a vida prega peças. Voltei. Estou no Brasil e de volta ao blog. Se sinto saudades do que vivi? Sim, o passado tem seu brilho. Mas o tempo passa.. e nós somos o reflexo de tudo aquilo que encontramos no nosso caminho. Trago comigo uma nova forma de ver a vida. Talvez a profundidade que conheci em Baltimore. Uma profundidade que exige distanciamento e, por vezes, solidão. Eu apreciava estar longe de tudo e de todos por esse motivo. Era forçada a olhar pra dentro e achar na minha própria companhia motivos pra suportar aquele frio desgraçado que tanto me faz falta hoje. Saudade do frio no dia-a-dia, do frio no Natal, de pegar ônibus no frio, de ver como as folhas se comportam no frio, de chegar em NY no frio, do cheiro do frio! Da vida noturna nos bares com seus jovens bêbados na porta, a gritaria nos sportsbar, ID check. Da experiência de trabalhar como garçonete.. Do verde que sempre me fazia companhia nos longas caminhadas. Engraçado, a gente sente saudade das folhas. 
De Los Angeles trago a espiritualidade dos meus mestres da Naam Yoga e da kundalini de Gurutej Kaur. As viagens por desertos, montanhas de neve, palcos de rock, parques verdes, praias de surf, salas de teste e o teatro Lounge Theater, este talvez o que me dê mais saudade que tudo. Ali, com Sal Landi e sua trupe, tive alguns dos melhores momentos da minha vida. Vivi outras idades, conheci outras terras, épocas, línguas.. Errei, acertei, lutei, aprendi, troquei, descobri, amei muito. É disso que se trata uma paixão. Desse fogo que vem do desejo de realizar. Em companhia de. Junto. Em grupo. Para o outro.
The Lounge Theater com Sal Landi e amigos
Já nao sei mais a que tema se deve este blog. Ao reler tudo hoje, me deparei com textos que me surpreenderam. Vi também coisas que quis apagar, temos mania de querer editar nossa história, mostrar o que é bonito, o que positiviza e eleva a imagem que os outros fazem de nós. Mas respirei fundo. Entendi esse diário como uma forma de me deixar fotografar pelo tempo. E gostei do que vi.


Retorno do Burning Man 2015


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